terça-feira, 20 de março de 2007

A Religiosidade na Idade Média


O homem medieval vive numa situação economicamente precária, sem segurança para o dia de amanhã. Mas isso não quer significar que vivesse no desespero. Há nele a certeza da existência de Deus, vive na fé em Deus, sente-se criatura de Deus. Antes do ano 1300 não havia ateus.

Uma das característica do cristão medieval é saber que vive no meio do combate entre o bem e o mal, na luta de São Miguel com Satanás. O cristão deve ser combatente do lado de Miguel.
Outra característica é aceitar-se num lugar social determinado: forte ou fraco, rico ou pobre, guerreiro ou trabalhador, religioso ou leigo. Nesta posição, ele vê a vontade de Deus. O homem medieval é obsessionado pelo pecado. Foi no século XII que foram fixados os sete vícios capitais: orgulho, avareza, gula, luxúria, ira, inveja, preguiça.
O mais importante, porém, é fixarmos os momentos vitais da espiritualidade medieval, seus gestos e ritos. Esta espiritualidade pode ser dividida em quatro momentos: as peregrinações, o culto das imagens e relíquias, a missa e a penitência.
AS PEREGRINAÇÕES

Faz parte da religiosidade universal considerar alguns lugares ou acidentes geográficos como sinais de manifestação do poder divino.
No mundo cristão, estes locais foram associados a relíquias, a túmulos de santos, a acontecimentos miraculosos, tão abundantes no mundo medieval. É difícil imaginar o sacrifício empreendido pelo peregrino na sua ânsia de chegar a um local sagrado: perigos, despesas, empréstimos, às vezes anos de caminhada. E freqüentemente havia o perigo da aventura, da exploração dos peregrinos nos locais sagrados. Construíram-se grandes albergues para hospedá-los, o que não excluía um certo desejo de lucro.
A partir do século XI, há mais um motivo para peregrinar: a sensação de experimentar um contato mais íntimo com Cristo, sua Mãe e seus atos em determinados lugares, como também a grande esperança de conseguir uma cura ou a remissão de um pecado muito grave.
A mais antiga das peregrinações é visita aos Lugares Santos na Palestina; segue-se Roma, primeiro aos túmulos de Pedro e Paulo e, mais tarde, ao Vigário de Cristo, o Papa. No século IX, temos o santuário de São Tiago de Compostela na Espanha, o túmulo dos Reis Magos em Colônia, Alemanha, o túmulo de Santo Tomás Becket em Cantuária, Inglaterra.
Temos ainda as pegadas do Arcanjo Gabriel no Monte Gargano, Itália, a Virgem de Chartres, França, o Precioso Sangue na abadia de Hales, Alemanha, a casa de Maria em Loreto, etc. Mais tarde, o túmulo de Santo Antônio em Pádua, de São Francisco em Assis.
O espírito das Cruzadas também deve ser incluído aqui. Não se deve esquecer aqui o gosto medieval pelas relíquias, em bom número falsificadas. O homem medieval parecia acreditar em tudo o que se afirmasse como sobrenatural!

O CULTO DAS imagens E RELÍQUIAS. AS DEVOÇÕES

Diversamente da Igreja no Oriente, que teve o grande problema da veneração das imagens, no Ocidente esse culto logo se impôs. Via-se na imagem, esculpida, pintada ou retratada num vitral, um meio para instruir sobre o significado do anúncio da salvação àqueles que não sabiam ler. As imagens narram a história da salvação, reforçam a recordação e elevam a piedade. Sempre se estava atento para não cair na adoração das imagens.
O culto das relíquias dos santos chegou ao exagero do roubo de parte do corpo dos santos. Não se concebia fundar uma cidade sem o túmulo de um santo, havendo, deste modo, lutas violentas para garantir o corpo, como a que aconteceu entre Benevento e Bari na Itália. O santo era o protetor, a garantia. Possuir uma relíquia era estar em contato certo e miraculoso com o santo. Mesmo dentro da legitimidade deste culto, não se pode esquecer os abusos da falsificação, do comércio e da superstição.
A devoção a Cristo foi sempre a que se sobressaiu, primeiramente visto como imperador, depois, a partir das Cruzadas, como o Crucificado. Pelo ano 1050, tem início a devoção da Via-Sacra, às Cinco Chagas. São Francisco introduz a devoção do Presépio.
O carinho por Maria sempre teve destaque, sendo invocada sobretudo através da oração da Salve Rainha e da Ave-Maria, além da prática do Rosário que, após 1450, tem 15 mistérios e, a partir de 2002, 20 mistérios.
A SANTA MISSA

A Missa sempre foi o centro do culto católico, fundamento e vida da comunidade, celebração da Paixão, Morte e Ressurreição do Senhor, comunhão dos fiéis com ele. No início da Idade Média, a Missa não era celebrada diariamente. Somente mais tarde teve início sua celebração diária, e as conseqüências nem sempre foram positivas, já que o culto dos santos milagrosos e das relíquias entrou em concorrência com a Missa. O importante para a vida presente é o Santo.
E a Missa? Ela fica reservada para a vida futura. Daí surge o interesse em ser sepultado perto da igreja ou dentro dela, participando assim dos “méritos” da celebração. Algo de estranho é introduzido nos mosteiros, a multiplicação de altares, de modo que, no mesmo tempo, eram celebradas diversas Missas. Para garantir celebrações “perpétuas”, havia ricos que deixavam grandes heranças aos mosteiros correndo o perigo de comercializar o sagrado.
Não entendendo o latim, língua usada na missa, os fiéis concentram sua atenção e devoção mais na presença real de Cristo na Hóstia consagrada. Momento fundamental, para o povo humilde, era a elevação da Hóstia, quando se tocava o sino. Pedia-se ao padre que mantivesse a Hóstia mais tempo elevada, pois assim se “participava” de mais Missas. Dessa forma, a Missa parece não ser mais uma celebração, mas um ato centrado na Hóstia.A festa de Corpus Christi nasce neste período com a finalidade de fazer a adoração pública da Hóstia. Multiplicam-se os Milagres Eucarísticos, como os de Bolsena, Cássia, Orvieto, onde hóstias sangram. Também por isso multiplicam-se as genuflexões, os sinais-da-cruz e as orações particulares. Neste quadro, podemos afirmar que, a partir do século VI, a cristandade latina não alimentou sua vida espiritual na Escritura e nos Sacramentos, mas nas inumeráveis devoções que a piedade popular foi criando. Foi preciso esperar o século XX para o retorno às fontes da santificação.
A PENITÊNCIA

Na Idade Média se suprime o caráter público e comunitário da penitência. Os monges irlandeses, escoceses e anglo-saxões adaptam a confissão às necessidades pastorais. A realidade penitencial passa a ser estreitamente relacionada com a Missa e a peregrinação.
No século VIII, o penitente se confessava, ganhava uma penitência secreta, era absolvido e já podia comungar. No passado, a confissão era apenas a acusação dos pecados para se entrar no estado de penitente: agora a confissão já inclui penitência e reconciliação. Torna-se obrigatória a confissão três vezes ao ano.
Livros Penitenciais ajudam o confessor a fixar a penitência. Por exemplo: um dia de jejum a pão e água pode ser substituído por 50 Salmos recitados de joelhos ou 70 em pé, ou então por 200 genuflexões. O pecado passa a ser coisificado, podendo ser expiado com um número de Salmos, com dias de jejum, com algumas surras ou, pior ainda, com o pagamento de taxas.
O que importa a Deus, dentro do espírito germânico, é que a ofensa seja paga: assim, o empregado pode fazer penitência em lugar do patrão, o jejum pode ser convertido em tarifa financeira, etc., uma série da abusos que explodirá mais tarde na questão das indulgências.
CONCLUSÃO
Esse quadro da piedade medieval não pode ocultar uma grande realidade deste período: a busca da santidade entre os pobres, os monges, reis e príncipes. A Idade Média é a grande era dos santos. Qual foi seu sustento principal? A oração pessoal, e penitência e, especialmente, a caridade.

Um comentário:

Unknown disse...

Caramba finalmente a idade media ficou facil de ser entendida!